quinta-feira, 30 de setembro de 2010

UNIVERSIDADE E ESCOLA: O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO VIA DE MÃO-DUPLA III

e) Educação Física e a política de inclusão
Quanto à inclusão, a Educação Física é uma das disciplinas que possibilitam maior integração dos alunos, e ao mesmo tempo se faz excludente numa cultura que não aceita as diferenças, principalmente quanto ao corpo e movimento humano. O processo de inclusão escolar precisa atender a três conjuntos: dos indivíduos com necessidades educacionais especiais, das diferenças étnico-culturais e do grupo de indivíduos com dificuldades não vinculadas a uma causa orgânica aparente.
No caso das crianças com necessidades educacionais especiais, deve haver uma maior integração entre o profissional de apoio e o professor de Educação Física, o que contribuiria para a adequação do processo de ensino-aprendizagem às diferentes possibilidades/necessidades dos alunos.
Quanto aos alunos com dificuldades não vinculadas a uma causa orgânica é preciso também adequar o processo ensino-aprendizagem à especificidade do aluno e da própria turma. Além do desafio de integrar indivíduos com limitações/deficiências, garantindo a estes o desenvolvimento de suas possibilidades educativas, os professores de Educação Física precisam integrar ainda os alunos com dificuldade de sociabilização, os alunos com complexos físicos, com diferenças de habilidades, maturidade, idade e/ou gênero, e os alunos menos aptos/habilidosos nas práticas corporais e com outros aspectos dificultantes para o processo ensino-aprendizagem deste aluno. Tudo isso sem tornar as práticas pedagógicas pouco desafiadoras para os mais aptos/habilidosos, garantindo o desenvolvimento e aprendizagem da totalidade de alunos.
Finalmente, existe a preocupação com a inclusão das diferenças decorrentes das diversas culturas étnico-raciais. A legislação brasileira preconiza que a integração se dê pelo desenvolvimento de conteúdos que mostrem a importância e o valor das suas contribuições para a formação da cultura brasileira, citando as manifestações de origem africanas e dos indígenas. Na Educação Física, a principal dimensão da cultura corporal sugerida para ser tematizada é a capoeira.
Objetivamente, as aulas de Educação Física tem a proposta de primar pelo respeito às diferenças entre os “diferentes” indivíduos, reconhecer as potencialidades de cada indivíduo e ao mesmo tempo proporcionar a integração entre os mesmos.
Nesse sentido, entendemos que o tema da educação inclusiva na Educação Física escolar pode ser pensada na perspectiva da coeducação, onde se oportunizam experiências de cooperação e solidariedade, e surgem as seguintes questões para reflexão: O que eu posso aprender com o outro, que é diferente de mim? Como as características particulares e individuais podem ser compartilhadas com os outros? Como integrar as características, particularidades e possibilidades individuais do movimento humano na prática coletiva da Educação Física escolar? Acreditamos que essas questões devem ser pensadas durante a elaboração das práticas pedagógicas, e não somente nas aulas de Educação Física, mas em todo ambiente escolar, tornando-se assim parte do cotidiano de cada educador e educando.

f) Educação Física: diferença e coeducação
O ambiente escolar apresenta como característica peculiar a heterogeneidade dos indivíduos que nela circulam. Nas aulas de Educação Física, essas diferenças parecem se acentuar ainda mais que em outros componentes curriculares.
Para lidar com essas diferenças existentes no contexto escolar, a Educação Física, orientada pelos PCNs (BRASIL, 1997), defende, por exemplo, o trabalho numa perspectiva de aulas mistas, onde meninos e meninas possam ter a oportunidade de conviver, aprender a respeitar as individualidades, e compreender as diferenças.
Essa abordagem requer uma intervenção coeducativa, objetivando uma maior interação não somente entre os gêneros, mas entre as várias diferenças existentes entre os seres humanos. Esta alternativa pedagógica defende que a educação deva ser trabalhada de modo que promova a problematização acerca das diferenças, estimulando os alunos a refletirem sobre esta questão e, assim, possa contribuir para a melhoria da convivência; facilitando a socialização, a aprendizagem, e a diminuição da violência, tanto nas aulas de Educação Física, quanto no contexto geral da escola.
Para se obter sucesso numa proposta coeducativa é fundamental que haja flexibilidade na proposição das atividades pedagógicas, para que se atenda aos diferentes interesses dos alunos. Desta maneira, a abordagem coeducativa visa a superação do modelo tradicional de aula, com o sujeito passando a ser parte integrante do processo de aprendizagem.
Para tanto, é necessário que se trabalhe nas aulas de Educação Física diversas formas de manifestação da cultura corporal, como a capoeira, a dança, a ginástica, os jogos, ou seja, outros conteúdos para além do esporte institucionalizado.
Importante também são os momentos da aula em que se discute com os alunos sobre o que foi realizado, conseguido e alcançado, para que eles tenham oportunidade de falar o que sentiram, o que foi mais significativo, o que não foi, o que poderia ser diferente, ou seja, as sugestões de cada um.
Nessa perspectiva, oportunizam-se experiências cooperativas e solidárias de cogestão, e é nesse sentido que a diferença deixa de ser um elemento de exclusão e passa a ser pensada como um elemento formativo.
A idéia de coeducação é aqui enfatizada para que o coletivo escolar se organize em prol de ações que valorizem as diferenças em suas variadas manifestações. Portanto, na perspectiva coeducativa, deve-se pensar a diferença como um elemento propulsor da aprendizagem para que assim ela possa fazer parte da formação humana e tornar-se presente no cotidiano de cada um de nós, como sujeitos sociais.


V. Considerações finais
A importância do estágio supervisionado na formação do professor da educação básica – aqui, de Educação Física – é suficientemente reconhecida por estudos desse campo. A experiência concreta de imersão na realidade escolar, vivenciada por ocasião do estágio, contribui na promoção de características profissionais que compõem aquilo que se denomina cultura docente. Ela se manifesta pelas habilidades necessárias ao adequado trato com os conhecimentos específicos e também com aquelas que se referem à prática pedagógica propriamente dita, bem como pelo reconhecimento das relações que configuram os espaços, tempos e atores sociais envolvidos no cotidiano da escola.
O caso aqui relatado representa um diferencial que julgamos relevante na formação docente inicial, por que se tratou de uma experiência acadêmica que mesmos professores com muitos anos de docência na escola não tem a oportunidade de vivenciar. Os estagiários envolvidos neste estudo, ao se tornarem autores do documento de Educação Física no PPP da escola, ajudaram a construir uma compreensão desse componente curricular que fica registrado e disponível como uma orientação para os professores de Educação Física que atuam ou venham a atuar na escola.
Além disso, a experiência possibilitou aos acadêmicos o aprofundamento de seus estudos a respeito do papel do PPP de uma escola pública e também sobre temas significativos à Educação Física escolar como a questão da coeducação, do sistema de ensino, além da política de inclusão adotada pela escola.
Por fim, percebemos que um professor, ao participar do processo de construção de um documento de tal relevância, como o PPP, possui maior facilidade para lidar com as situações que, por ventura, venham a ocorrer no campo, justamente por deter esclarecimento sobre as problemáticas advindas do mesmo.

Filipi Flor Teixeira
Daiane Raquel Viero Ricken
Fernanda Fauth
Lucas Barreto Klein
Priscila Cristina dos Santos

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

UNIVERSIDADE E ESCOLA: O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO VIA DE MÃO-DUPLA II

c) Metodologia – princípios pedagógicos como referência para planejar e avaliar
Esse tópico do documento inicia realizando uma discussão acerca da maneira como o conhecimento pode ser viabilizado: formal ou informalmente. O conhecimento informal refere-se àquele adquirido pelas vivências que se tem na comunidade, em casa, com os amigos, enfim. Já o formal trata-se de um saber sistematizado, historicamente produzido, que justifica a existência social da escola, ainda que os saberes informais também tenham espaço no seu interior.
Para que o professor tematize esse conhecimento formal na sua prática pedagógica, precisa fazer uso de uma metodologia que organize o processo de ensino-aprendizagem. Então, como escolha metodológica a ser realizada, o texto defende a idéia de apropriação do conhecimento, o qual, na Educação Física, significa organizar a prática pedagógica de tal forma que seja possível ao educando acessar e compreender o conhecimento teórico e prático da cultura corporal para a assimilação consciente do mesmo. Ou seja, possibilitar que, a partir da mediação entre o conhecimento sistematizado e o conhecimento de que o aluno já dispõe, este possa pensar de forma autônoma sobre o mesmo e, isso significa também estimular a criticidade neste educando.
Com relação à prática pedagógica, o documento orienta pensá-la a partir de princípios pedagógicos, que podem ser vistos como eixos orientadores da prática docente, a partir dos quais pode ser procedida a elaboração do planejamento do ensino e a respectiva reflexão sobre e para a construção da práxis.
Nesse sentido, tendo como base as diretrizes curriculares da Educação Física da Prefeitura de Florianópolis (GEAEF, 1996) , com pequenas adequações textuais, são apresentados alguns princípios pedagógicos que vão ao encontro com a proposta acima supracitada: princípio da totalidade, da continuidade-e-ruptura, da criticidade, da cogestão, da cooperação, da ludicidade, da dialogicidade.
Com o objetivo de melhor elucidar o que tais princípios manifestam, realizamos a seguir a descrição de alguns (três) deles, os quais foram escolhidos sem a utilização de critérios específicos. Todavia, é válido salientar que todos os princípios supracitados estão devidamente explicados no documento aqui referido.
O princípio da totalidade pressupõe que a Educação Física escolar deva proporcionar ao aluno um entendimento crítico do que se passa na aula, na escola, na sociedade, contextualizando-o histórica e socialmente. Esta perspectiva de totalidade deve contribuir na superação de dicotomias relacionadas a corpo-mente, homem-sociedade, sociedade-meio-ambiente, etc.
O princípio da continuidade-e-ruptura baseia-se na consideração e valorização do conhecimento que o aluno traz consigo, para que, através da vivência/discussão/reflexão sobre o mesmo, possa romper com o estabelecido, na busca da construção de um novo conhecimento, que não negue o anterior, mas que o inclua e supere em amplitude e complexidade.
Por fim, o terceiro aqui exemplificado, princípio da criticidade, fundamenta-se nos anteriores, permitindo ao aluno situar-se enquanto sujeito histórico-social, e ao conhecimento que constrói coletivamente, numa perspectiva crítica da sociedade, entendendo os valores e interesses que aderem a esta cultura de movimento e ampliando assim, suas possibilidades de intervenção no contexto social.
Esses princípios, assumidos como referência metodológica do processo de ensino-aprendizagem, podem ser vinculados também à avaliação na Educação Física escolar, desde que essa avaliação compreenda uma interpretação do processo pedagógico de modo contínuo e com uma variedade de elementos avaliativos.


d) O esporte e a técnica na Educação Física escolar
O esporte ainda é o conteúdo mais explorado nas aulas de Educação Física, porém as críticas quanto ao “tecnicismo” exacerbado resultaram numa espécie de negação ideológica ao ensino das técnicas de modalidades esportivas no esporte escolar. Atualmente, estudos apontam para a necessidade de se refletir sobre o desafio do processo de ensino aprendizagem do esporte na escola, questionando: como desenvolver o esporte na escola, visando uma adequada inserção dos alunos à cultura esportiva, o que inclui o rendimento técnico nas ações práticas, sem que essa busca signifique exclusão dos menos aptos?
Kunz (1996) afirma necessária uma reflexão do esporte como um “rendimento necessário”, que proporcionaria a compreensão ampliada do fenômeno esporte como parte da cultura corporal, em suas diversas dimensões e possibilidades, incluindo a sua prática como atividade de lazer, resultando em participação, fruição estética e prazer para todos; evitando assim o “rendimento obrigatório”, que exige a seleção dos alunos, sua especialização, instrumentalização e, por conseqüência, exclusão.
Também é válida a referência à reflexão de Hildebrandt-Stramann (2001) que considera o esporte, ao mesmo tempo, como “algo socialmente regulamentado”, “algo a ser aprendido”, “algo a que se assiste”, “algo a ser refletido” e ainda “algo a ser modificado” (p.156-137).
Associando, então, o rendimento aos conteúdos da Educação Física Escolar e visando à formação de indivíduos capazes, autônomos e críticos, é necessário que vivências corporais (técnicas) sejam tematizadas durante as aulas, como práticas e para além destas.

Filipi Flor Teixeira
Daiane Raquel Viero Ricken
Fernanda Fauth
Lucas Barreto Klein
Priscila Cristina dos Santos

terça-feira, 21 de setembro de 2010

UNIVERSIDADE E ESCOLA: O ESTÁGIO SUPERVISIONADO COMO VIA DE MÃO-DUPLA

Recentemente acadêmicos de educação física da UFSC realizaram um exercício de estágio em uma escola municipal da rede de ensino de Florianópolis, e como tarefa produziram o Projeto Político Pedagógico da Educação Física desta escola.

Apresentarei agora uma série de ítens que compuseram este trabalho, que agora tornou-se artigo (publicado na Revista Brasileira de Ciência do Esporte)

a) Introdução e Visão de Área
O texto inicia destacando o fato de a LDB 9394/96 ter tornado a Educação Física um componente curricular integrado ao projeto pedagógico da escola, ressaltando a importância e as responsabilidades decorrentes disso, já que historicamente a Educação Física foi concebida como atividade, limitada à sua dimensão prática e utilitarista.
Para situar o campo, é identificado o seu objeto de estudo e de intervenção na chamada cultura corporal , mas alertando para o fato de que a tematização de suas diversas manifestações no âmbito escolar precisa passar por uma transposição didática para constituírem-se em conteúdos pedagógico-educativos. Sintetiza afirmando que o conhecimento “da” Educação Física na escola é, ao mesmo tempo, um “saber-fazer”, um “saber sobre o saber-fazer” e um “saber-porque-fazer”.

b) Organização curricular em ciclos
Conforme consta no texto, a organização curricular da Educação Física foi pensada de acordo a nova legislação sobre o ensino fundamental em nove anos e o que orienta o PPP da escola, ou seja, cinco anos iniciais e quatro finais, assim constituídos: do 1º ao 3º ano – Bloco inicial de Alfabetização; do 4º ao 5º ano – Anos Intermediários; do 6º ao 9º ano – Anos Finais.
Embora sem abandonar a referência às séries/anos, o documento propõe pensar a seleção e organização dos conteúdos da Educação Física sob a forma de ciclos de formação, a partir do entendimento do processo de ensino-aprendizagem dos alunos, conforme exposto tanto na já citada obra do Coletivo de Autores (1992), quanto na constituição do ensino fundamental em nove anos, acima mencionada. Nesse sentido, o primeiro ciclo (do 1º ao 3º ano) corresponde ao ciclo da organização da identidade dos dados da realidade. O segundo ciclo (do 4º ao 5º ano) relaciona-se a iniciação da sistematização do conhecimento. E por fim, o terceiro ciclo (do 6º ao 9º ano) condiz a ampliação da sistematização do conhecimento, reorganização e síntese.
Dessa forma, buscando contribuir com o desenvolvimento integral dos estudantes, a partir de conhecimentos que consideram a heterogeneidade como uma força motriz da aprendizagem escolar (FETZNER, 2005), cada ciclo integra e amplia o precedente num movimento contínuo e espiral, sendo tais conhecimentos trabalhados de maneira simultânea.


Daiane Raquel Viero Ricken
Fernanda Fauth
Filipi Flor Teixeira
Lucas Barreto Klein
Priscila Cristina dos Santos